Mirene
Cardinalli era filha de pais artistas numa companhia itinerante e irmã da
actriz e cantora Helena Cardinalli. Pertencia à conhecida família Cardinalli,
de origens italianas e muito ligada ao meio artístico.
Começou
a cantar aos 7 anos, no Porto, em emissões de rádio e logo depois fez teatro
infantil. Como os seus pais mudavam constantemente de lugar, passou a viver em
Canas de Senhorim com a sua avó, uma antiga circense italiana, quando andava no
4 ano de escolaridade.
Mais
tarde, matriculou-se numa escola em Silves, mas como se tornava cansativo, já
que os seus pais viviam em Portimão, decidiu largar os estudos e trabalhar com
os pais.
Num
dos espectáculos da família, José Peixoto Matias, natural de Tomar, conheceu
Mirene, na altura com 15 anos. Este relacionamento não era bem visto pela mãe
de José, pois Mirene pertencia a uma família de artistas e um matrimónio com um
artista não era visto com bons olhos pela sociedade da época. Por isso, mandou
o seu filho para Angola, de forma a impedir o casamento. No entanto, ambos se
casaram por procuração: José em Angola e Mirene, com 17 anos, em Alcácer do
Sal.
Após
o casamento, Mirene foi viver para Luanda com o seu marido e voltou a cantar,
desta vez em Angola, onde teve os seus grandes sucessos artísticos. Em 1961,
foi convidada a actuar em Luanda e Mirene obteve um indiscutível sucesso, quer
a nível de público quer da crítica, razão que a levou a fixar residência nessa
cidade dois anos depois. Por essa altura, conquistou o prémio de
interpretação no VII Festival da Canção de Angola com a canção “Poema
do Ocaso” e, em 1966, o título de Rainha da Rádio de Angola. Nesse
mesmo ano, conquista o 1º lugar no Festival da Canção de Luanda, com a
canção “Julgamento”, e grava o seu primeiro disco.
De
baixa estatura, mas com uma voz poderosa combinada com uma representação
invulgar, Mirene tornou-se numa das cantoras mais conhecidas e requisitadas na
época em Angola.
«Quando
assinei contrato para gravar o meu primeiro disco, as lágrimas rolaram-me pela
cara. Cantava já há 17 anos e via fugirem-me as esperanças. Talvez as pessoas
não acreditassem em mim. Talvez lhes parecesse impossível que num corpo tão
franzino morasse uma voz tão forte...».
Regressou,
em 1967, à Metrópole onde se fixou e prosseguiu com a sua carreira de cantora
com grande êxito. Marcou presença no Festival Luso-Galaico da Canção do
Minho, nos festivais de Ourense e de Aranda do Douro, no VII
Festival da Canção da Figueira da Foz e no Festival da Costa Verde,
alcançando neste último o 3º lugar com “Onde Morre o Sol”.
Deu
espectáculos por todo o país e no Casino do Estoril e, após se submeter
às habituais provas de admissão, tornou-se presença frequente na televisão e
nos espectáculos da Emissora. Viajou e recebeu aplausos no Canadá e no
Brasil e gravou três discos que obtiveram êxito. Também obteve sucesso no
teatro, pelo qual tinha uma paixão já desde a adolescência.
Em
1968, participou no Festival RTP da Canção com a canção “Vento Não
Vou Contigo”, da dupla Rui Malhoa e Pedro Jordão, que alcançou o 8º lugar,
empatada com “Dentro de Outro Mundo” de Simone de Oliveira.
Tal
como tinha acontecido anos antes com a cantora Marina Neves, por esta altura
alguns críticos consideravam o estilo e o timbre de Mirene pouco original, pois
assemelhava-se ao de Simone de Oliveira, que na época era a voz feminina mais
conceituada. Mirene, apesar de não negar as semelhanças que tinha com Simone,
lembrava que começou a cantar ainda antes dela e que manteve sempre o mesmo
estilo.
Em
1969, Mirene gravou um novo disco com três canções concorrentes ao Festival
da Canção desse ano: “Sol da Manhã”, “Canção Para um Poeta” e
“Sombra de Ninguém”. Dois anos antes já tinha gravado a canção “Livro
Sem Fim”, dos Duo Ouro Negro, concorrente ao Festival da Canção
de 1967.
Em
Dezembro de 1969, Mirene participou numa emissão especial do programa da RTP
“Riso & Ritmo”, alusiva à quadra natalícia, onde anunciou um
novo disco que iria marcar um novo rumo na sua carreira, que incluiria duas
canções compostas por Vieira da Silva: “Para a Construção da Cidade
Necessária” e “Da Solidão e do Trigo”. No entanto, a sua morte dias
após a gravação do programa acabou por pôr um fim a esses planos, atrasando até
a emissão do programa, que estava prevista para o dia 21 de Dezembro e que acabou
por estrear no dia 28 do mesmo mês. Essa emissão especial foi um dos programas
mais vistos da época.
Mirene
Cardinalli faleceu em Dezembro de 1969 no Hospital de Vila Franca de Xira,
aos 27 anos, vítima de um brutal acidente de viação na recta do Cabo, na EN10,
quando se dirigia para uma festa de beneficência em Évora. Um veículo surgiu
pela frente e embateu na viatura da cantora, vitimando mortalmente, para além
de Mirene, o seu marido, que conduzia a viatura, e o jovem cantor Carlos Belo.
O condutor da outra viatura também não sobreviveu ao acidente e Maria de
Lourdes Resende, que ia na viatura de Mirene, foi a única sobrevivente.
Os
corpos de Mirene e do seu marido foram identificados no hospital por Madalena
Iglésias, que, ao regressar de um espectáculo, passara por Vila Franca de Xira
momentos depois do acidente.
Mirene
deixou dois filhos pequenos, que ficaram ao cuidado da sua sogra, em Tomar.
O
programa de rádio “1-8-0” organizou um espectáculo de angariação de
fundos no Teatro Monumental no dia 13 de Janeiro de 1970, com o intuito
de ajudar os filhos da cantora. Este espectáculo contou com o apoio de um
grande número de artistas portugueses, como Carlos do Carmo, Tonicha, Artur
Garcia, Gina Maria, António Calvário, Maria José Valério, Maria da Fé, Tony de
Matos, Mafalda Sofia, Mara Abrantes, Fernando Farinha, Hermínia Silva e João
Maria Tudela.

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