sábado, 11 de outubro de 2003

A AMPULHETA DA VIDA

Como passa depressa o tempo! - Ainda «ontem» César era um menino de calções, ansiando pelo momento de entrar para a escola. Em breve, desejaria ser adolescente para ter mais «liberdade» e (que ambição!) ter a chave de casa. E, cada vez mais, queria que a vida andasse depressa: a maioridade, a carta de condução, a faculdade, o serviço militar… Namorar, casar e ter filhos. Ter uma casa só sua, um bom emprego. Subir na carreira. Ter muitos amigos.
E assim tudo foi acontecendo. Vieram os trinta anos. Os quarenta. E nunca pensou sequer em olhar para a ampulheta da vida. Inexoravelmente, porém, a areia deslizava, esvaziando um dos lados e enchendo o outro.
Vieram os cinquenta anos e os netos. Os sessenta e os primeiros sintomas de que as células humanas envelhecem e os cabelos se tornam da cor da neve.
Sendo normalmente pessimista, mas fazendo um esforço, aceitou como possível que poderia viver ainda mais uns vinte anos. Teriam portanto já passado três quartos da sua vida, faltando apenas um.
Na praia, agarrando um punhado de areia, César observa os pequenos grãos escorrendo por entre os dedos. Aperta mais a mão para adiar o inadiável. As gaivotas esvoaçam, poisando aqui e ali. Ele segue-as com os olhos e pensa...
…Pensa que, apesar de tudo, se um dia se tornar dependente ou perder a lucidez, quererá ainda ter um resto de discernimento, de força e de coragem para abrir rapidamente a mão, de modo a que a areia deslize toda de uma vez. A ampulheta, que mediu a sua vida, finalizará mais cedo a sua missão…

G. de S.

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