quinta-feira, 1 de abril de 2004

O VOTO EM BRANCO...

Quando olhamos a ementa num restaurante, escolhemos um prato de que gostamos, ou somos sugestionados por um nome, ou agrada-nos o aspecto doutro que acabou de passar para a mesa ao lado ou, então, escolhemos um que alguém nos recomendou. As nossas escolhas, em política, seriam consideradas como «votos expressos», prova de confiança nos respectivos pitéus apesar de, muitas vezes, ficarmos desiludidos depois de os provar, pois as nossas expectativas são defraudadas. Da próxima vez, porém, escolheremos melhor.
Se olhamos o cardápio antes de entrar e não encontramos nada a nosso gosto, afastamo-nos e primamos então pela nossa «abstenção».
Se o nosso desencanto se manifesta já à mesa, quando o empregado nos entrega a ementa, aí não há abstenção que nos valha, pois já abrimos o pão e a manteiga e pedimos o aperitivo. Damos então o nosso «voto em branco». Ficamos, mas pedimos um bife normalíssimo ou uma omeleta com batatas fritas.
Daqueles que se abstêm, o dono do restaurante não se dá conta. Dirá apenas que o negócio está mau. O voto em branco, este, já o obrigará a alterar alguma coisa. «Assim não pode continuar!» Os pratos do dia ficam e estragam-se e só se vendem bifes e omeletas. Há que despedir a cozinheira, procurar novo empregado de mesa e confeccionar novos pratos. E a vida seguirá. Talvez para mudar tempos mais tarde.
Pensei nisto a propósito do último livro de Saramago. O problema é que a Democracia não tem dono. Se isto acontecesse na nossa vida política, quem despediria o pessoal e remodelaria o sistema?
José Saramago não estaria certamente a pensar num «salvador», mas assim não vale. Escrever um romance? - Perfeito, para mais com a qualidade e o estilo com que Saramago nos habituou e que lhe valeu o prémio Nobel. Mas só deitar achas na fogueira, só acenar com um pseudo-perigo e não apresentar soluções, não vale.
A Democracia, mesmo aquela meramente formal em que vivemos, pode criar soluções no seu seio. Que mais não seja a formação de um novo partido sem os vícios nem as ligações «perigosas» dos já existentes. Claro que esta solução não interessaria aos partidos do sistema, que começariam por nem querer ouvir falar nele e que acabariam talvez por se aliar, para inviabilizar ou dificultar a sua formação.
A Democracia nunca será perfeita mas, como disse alguém, ainda é o melhor sistema político que se conhece. Tivemos uma oportunidade, há cerca de trinta anos, de criar algo de inovador beneficiando dos erros alheios, mas o «sistema» recuperou rapidamente e, deixando-nos embora a liberdade formal, criou todos os obstáculos possíveis e imaginários para que não passássemos de uma democracia formal. Os responsáveis por isto ter acontecido andam por aí, rotulados de arautos da liberdade, mas liberdade SÓ não chega! A Democracia devia servir para mais alguma coisa…

Sem comentários:

Arquivo do blogue

Acerca de mim

A minha foto
- Lisboa, Portugal
Aposentado da Aviação Comercial, gosto de escrever nas horas livres que - agora - são muitas mais...