EFEMÉRIDE - José
Carlos Pereira Ary dos Santos, poeta e declamador português, nasceu
em Lisboa, São Sebastião da Pedreira, no dia 7 de Dezembro de 1937. Morreu
em Lisboa, Santiago, em 18 de Janeiro de 1984.
Ficou na História da música
portuguesa por ter escrito os poemas de 4 canções vencedoras do Festival RTP
da Canção e apuradas para representarem Portugal no Festival Eurovisão
da Canção: “Desfolhada Portuguesa” (1969), com interpretação de
Simone de Oliveira, “Menina do Alto da Serra” (1971), interpretada por
Tonicha, “Tourada” (1973), interpretada por Fernando Tordo e “Portugal
no Coração” (1977), interpretada pelo grupo Os Amigos. Além disso,
assinala-se ainda a sua importante colaboração como letrista de fados e/ou
canções interpretados por Amália Rodrigues e Carlos do Carmo.
De uma família da alta
burguesia de origens aristocratas, era filho do médico Carlos Ary dos Santos e
de sua esposa Maria Bárbara de Miranda e Castro Pereira da Silva. Irmão germano
de Maria do Rosário de Castro Pereira Ary dos Santos, Maria Isabel Pereira Ary
dos Santos e de Diogo António Pereira Ary dos Santos, e irmão consanguíneo de
Ana Maria Granger Ary dos Santos.
O seu avô paterno foi o prof.
dr. Carlos Ary dos Santos, docente na Faculdade de Medicina de Lisboa e
autor de diversos ensaios na sua área profissional, bem como, sobre numismática
e medalhística.
Ary dos Santos iniciou a sua
instrução no Colégio Infante Sagres, em Lisboa, mas, tendo sido expulso
por mau comportamento, passou para o colégio jesuíta Nun’Álvares, em
Caldas da Saúde, Santo Tirso. Mais tarde, regressou aos estudos em Lisboa, no Colégio
São João de Brito, onde foi um dos primeiros estudantes.
Após a morte da mãe, viu
publicados, pela mão de familiares, alguns dos seus poemas. Tinha 14 anos e
viria a rejeitar esse livro, que considerava de fraca qualidade. O poeta
eminente revelaria as suas qualidades em 1954, ao ser incluído na “Antologia
do Prémio Almeida Garrett”.
Pela mesma altura,
incompatibilizado com o pai pela homossexualidade do poeta, abandonou a casa da
família. Para seu sustento económico exerceu as mais variadas actividades,
desde vender máquinas para pastilhas elásticas a empregado numa empresa de
publicidade. Frequentou as Faculdades de Direito e Letras, mas
nunca acabou os cursos.
A sua estreia literária efectiva
deu-se com a publicação de “A Liturgia do Sangue” (1963).
Em 1969, aderiu ao Partido
Comunista Português, com o qual participou activamente nas sessões de
poesia do então intitulado Canto Livre Perseguido.
Através da música chegará ao
grande público, concorrendo, por mais de uma vez, ao Festival RTP da Canção,
sob pseudónimo, como exigia o regulamento. Classificar-se-ia em primeiro lugar
com as canções “Desfolhada Portuguesa” (1969), com interpretação de
Simone de Oliveira, “Menina do Alto da Serra” (1971), interpretada por
Tonicha, “Tourada” (1973), interpretada por Fernando Tordo e “Portugal
no Coração” (1977), interpretada pelo grupo Os Amigos.
Com Fernando Tordo, escreve
mais de 100 poemas para canções do músico e o duo Tordo/Ary continua a ser, até
hoje, um dos mais profícuos da História da Música Portuguesa.
São de sua autoria canções
intemporais, como “Tourada”, “Estrela da Tarde”, “Cavalo à
Solta”, “Lisboa Menina e Moça”, “O amigo que eu canto”, “Café”,
“Dizer Que Sim à Vida”, “Rock Chock” e “Meu amigo está longe”.
Estas canções foram
interpretadas por cantores como Fernando Tordo, Carlos do Carmo, Mariza, Amália
Rodrigues, Mafalda Arnauth e Paulo de Carvalho. Alguns dos maiores sucessos
deste último, como “Os Putos”, “Lisboa Menina e Moça” e “Quando
Um Homem Quiser” foram com poemas de Ary dos Santos. Também Carlos do Carmo
cantou “Lisboa, menina e moça”, “Os putos”, e outras letras de
Ary, sendo de destacar o seu álbum antológico “Um homem na cidade”,
composto por 12 temas, todos com letra do poeta, aliados a um conjunto de
composições inovadoras; entre eles, além de “Um homem na cidade”,
refiram-se “Fado do Campo Grande”, “Nova feira da ladra”, “Namorados
de Lisboa”, “Fado varina” ou “Balada para uma velhinha”.
Além dessas, “Estrela da
tarde”, “Menor/Maior”, “Sonata de Outono” ou “Novo fado
alegre” são igualmente temas de referência na carreira do fadista, escritas
por Ary dos Santos.
Após o 25 de Abril,
torna-se um activo dinamizador cultural da esquerda, percorrendo o país de lés
a lés. No Verão Quente de 1975, juntamente com militantes da UDP
e de outras forças radicais, envolveu-se no assalto à Embaixada de Espanha,
em Lisboa.
Autor de mais de seiscentos
poemas para canções, Ary dos Santos fez no meio muitos amigos. Gravou, ele
próprio, textos ou poemas de e com muitos outros autores e intérpretes.
Notabilizou-se também como
declamador, tendo gravado um duplo álbum contendo “O Sermão de Santo António
aos Peixes”, do Padre António Vieira. À data da sua morte, tinha em
preparação um livro de poemas intitulado “As Palavras das Cantigas”,
onde era seu propósito reunir os melhores poemas dos últimos quinze anos, e um
outro intitulado “Estrada da Luz - Rua da Saudade”, que pretendia ser
uma autobiografia romanceada.
Homem de personalidade forte
e de apetites excessivos, grande fumador e bebedor, acabaria por adoecer de
cirrose, vindo a falecer com apenas 47 anos, em Janeiro de 1984, na sua casa na
Rua da Saudade, em Alfama, Lisboa. Instituiu como seu herdeiro universal
o Partido Comunista Português.
Homossexual assumido, a sua
orientação sexual foi a causa principal da sua saída de casa com apenas 16
anos, e de começar a trabalhar nessa idade para se sustentar.
Ary dos Santos deixou poucos
textos sobre a temática LGBTI, que fossem explícitos. Um raro exemplo é
o poema “Meu Amigo Está Longe”. O amigo que estava longe era um soldado
de quem Ary dos Santos gostava e que tinha partido para a guerra do Ultramar.
O seu nome foi dado a um
largo do Bairro de Alfama, descerrando-se uma lápide evocativa na
fachada da sua casa, na Rua da Saudade, onde viveu praticamente toda a sua
vida.
Ainda em 1984, foi lançada a
obra “VIII Sonetos de Ary dos Santos”, com um estudo sobre o autor de
Manuel Gusmão e planeamento gráfico de Rogério Ribeiro, no decorrer de uma
sessão na Sociedade Portuguesa de Autores, da qual o autor era membro.
Em 1988, Fernando Tordo
editou o disco “O Menino Ary dos Santos”, com os poemas escritos por Ary
dos Santos na sua infância.
Em 2009, Mafalda Arnauth,
Susana Félix, Viviane e Luanda Cozetti deram voz ao álbum de tributo “Rua da
Saudade - canções de Ary dos Santos”.
Hoje, o poeta do povo é
reconhecido por todos e todos conhecem José Carlos Ary dos Santos, pois a sua
obra permanece na memória de todos e, surpreendentemente, muitos dos seus
poemas continuam actualizados. Todos os grandes cantores o interpretaram e ainda
hoje surgem boas vozes a cantá-lo na perfeição. Desde Fernando Tordo, Simone de
Oliveira, Tonicha, Paulo de Carvalho, Carlos do Carmo, Amália Rodrigues, Maria
Armanda, Teresa Silva Carvalho, Vasco Rafael, entre outros, até aos mais
recentes como Susana Félix, Viviane, Mário Barradas, Vanessa Silva e Katia
Guerreiro.
Em 4 de Outubro de 2004, foi
feito grande-oficial da Ordem do Infante D. Henrique a título
póstumo.
No dia 4 de Junho de 2016,
foi inaugurada em Sacavém (Loures) a Biblioteca Municipal Ary dos Santos.