É um dos representantes e teóricos do cinema directo.
Como cineasta e etnólogo, explora o documentário puro e a docuficção,
criando um subgénero: a etnoficção.
Um fã de Rouch, Jean-Luc Godard, faz esta pergunta: «Jean
Rouch não usurpou o título do seu cartão de visita: responsável pela
investigação no Museu do Homem. Será que existe uma definição mais bonita do
cineasta?».
Jean Rouch era filho de Jules Rouch, meteorologista,
explorador e director do Museu Oceanográfico de Mónaco.
Companheiro de Jean-Baptiste Charcot, Jules Rouch participou numa das
expedições polares francesas à Antárctida entre 1908 e 1910. Ao
desembarcar do navio Pourquoi pas?, trava
conhecimento com Luce Gain, que vinha receber o seu irmão Louis, especialista
em pinguins-imperadores. Da união de Jules e Luce
nasceram Geneviève e Jean Rouch.
Depois de se formar em Engenharia Civil,
juntamente com dois colegas, Jean Sauvy e Pierre Ponty, Rouch resolve ir
trabalhar como engenheiro de obras públicas em África. É destacado para o
Níger, onde constrói estradas e pontes. Ao assistir à morte de operários
atingidos por uma faísca durante as obras, descobre os mistérios da religião e
da magia songai e decide estudar etnologia. Expulso da colónia francesa
do Níger, organiza em Dakar campanhas militares de libertação, lutando contra a
ocupação da França. Junta-se depois à 1ª Divisão Blindada do General Leclerc
e entra em Berlim com os exércitos aliados, no ano de 1945.
De regresso a França, frequenta os cursos de Marcel
Mauss e de Marcel Griaule. Regressa a África com Jean Sauvy e Pierre Ponty para
descer em piroga os 4 200 km do Rio Níger, desde a nascente até ao oceano.
Depois desse feito, faz outras missões e defende tese com o mestre Marcel
Griaulle, ele também pioneiro do filme etnográfico.
Investigador do CNRS (Centre National de la
Recherche Scientifique), cria em Paris, em 1953, com Henri Langlois, Enrico
Fulchignoni, Marcel Griaule, André Leroi-Gourhan e Claude Lévi-Strauss, o Comité
do Filme Etnográfico, com sede no Museu do Homem.
Certo dia do ano de 1954, de que Rouch por vezes
falava, perante jovens africanos e intelectuais amantes do cinema e da
etnografia, Marcel Griaulle pediu-lhe que destruísse - por o considerar
cientificamente incorrecto - o documentário “Les Maîtres Fous” “(Os
Mestres Loucos”), filme sobre um ritual de possessão de uma seita
religiosa, pretensão que provocou acesa polémica e levou Rouch a afirmar que
não se limitava a filmar documentos anónimos, feitos para arquivo e destinados
a especialistas, mas sim e sobretudo que pretendia com os seus filmes dar a ver
ao mundo costumes e práticas desconhecidas do Homem e ainda o modo como as
sociedades e as culturas tradicionais africanas se transformam devido a agentes
externos, neste caso o colonialismo inglês.
Em 1978, as autoridades da jovem república de
Moçambique pedem a cineastas conhecidos, entre os quais Jean-Luc Godard e Ruy
Guerra (moçambicano, brasileiro e português), que se empenhem na criação de uma
política cinematográfica e televisiva inovadora. No que lhe toca, Jean Rouch
aposta numa experiência baseada na formação de futuros cineastas locais. Com
Jacques d’Arthuys, adido cultural da Embaixada Francesa na cidade do
Porto, constitui um atelier de formação na área do filme documentário, em
película de Super 8, com recurso a uma pedagogia simples, assente na
prática: «filmar de manhã, revelar ao meio-dia, projectar à tarde». No
seguimento dessa experiência, serão criados em Paris, no ano de 1981, os Ateliers
Varan.
Exercendo um olhar analítico sobre os costumes,
tradições e rituais dos povos locais e, de um modo inovador, usando câmaras
leves de 16 mm, Jean Rouch, com uma grande liberdade de estilo perante
os cânones tradicionais da prática etnográfica, alternando entre documentário e
ficção, obteve o reconhecimento internacional de cineastas e de especialistas
da sua área. É um dos fundadores e um dos primeiros teóricos da antropologia
visual.
Durante toda a sua carreira, Rouch, reputado pela sua
agilidade intelectual e pelo dom da palavra, ensina incansavelmente a fazer
cinema, em África e nos Estados Unidos, e realiza cerca de 120 filmes,
suscitando múltiplas vocações de cineastas pelo mundo fora.
Influenciado por Dziga Vertov e Robert Flaherty, Jean
Rouch é um dos pais fundadores do cinema-verdade. Foi fonte de
inspiração e constante referência para os realizadores da Nouvelle Vague.
Presidente da Cinemateca Francesa durante cinco anos (1986 a 1991), é
laureado com o Prémio Internacional da Paz. A sua obra, coroada com
várias recompensas de prestígio, inscreve-se na história universal do cinema.
Na sua derradeira missão ao Níger, na estrada de
Tahoua, a leste do país, é vítima de um acidente mortal de automóvel, ocorrido
a 15 de Fevereiro de 2004, ao cair da noite, a 16 km da cidade de Birni N’Konni.
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