De família burguesa, de raízes alentejanas, a sua mãe,
de nome Amália Pires, dona de casa, era de Pavia, no Alto-Alentejo, e foi viver
para Évora, onde se casou com José Cutileiro, um médico da Organização
Mundial da Saúde aí sediado. Dos três filhos do casal, o seu irmão, o
escultor João Cutileiro era o do meio.
Em Lisboa, a família Cutileiro vivia na Av. Elias
Garcia, numa casa afamada por ser frequentada pela chamada intelligentsia,
um grupo de personalidades da época. A família do pai era republicana e
oposicionista ao regime do Estado Novo; a família da mãe era católica
conservadora, além de apoiante do regime de Salazar.
Quando tinha três anos, a família deixou a cidade de
Évora e passou a viver em Lisboa. Mais tarde, o pai, sofrendo constrangimentos
na direcção do Centro de Saúde de Lisboa por motivos políticos - antes,
fora afastado de um concurso para professor na Faculdade de Medicina de
Lisboa, por interferência da PIDE - pôs a sua profissão ao serviço
da Organização Mundial da Saúde. Foi assim que, por força da actividade
profissional do pai, Cutileiro passou parte da sua adolescência em países tão
distintos como a Suíça, a Índia e o Paquistão.
De novo em Lisboa, terminou os estudos secundários no Colégio
Valsassina, passando em seguida pelos cursos de Arquitectura e de Medicina,
na Escola Superior de Belas-Artes e na Faculdade de Medicina da Universidade
de Lisboa, respectivamente. Esse é também o tempo das tertúlias no Almanaque,
com José Cardoso Pires e Luís de Sttau Monteiro.
Abandonando os estudos em Portugal, decidiu viajar
para o Reino Unido, onde viria a licenciar-se em Antropologia Social, na
Universidade de Oxford. Subsequentemente, no ano de 1968, completou o
doutoramento na mesma disciplina com a tese “A Portuguese Rural Society”,
descrição antropológica de Monsaraz, uma freguesia rural alentejana, referida
na obra apenas como Vila Velha.
Ingressou depois no St. Antony’s College, como fellow
(1968/1971), passando, em seguida, para a London School of Economics and
Political Science, como lecturer (1971/1974).
Com a Revolução de 25 de Abril de 1974, foi nomeado
conselheiro cultural da Embaixada de Portugal em Londres, cargo que desempenhou
de 1974 até 1977.
Torna-se, em seguida, embaixador e representante de
Portugal junto do Conselho da Europa, cargo que desempenhou até 1980.
Passou ainda pela Embaixada de Portugal no Maputo. Em 16 de Agosto de
1983, foi agraciado com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.
A 14 de Janeiro de 1984, foi nomeado representante permanente de Portugal junto
da Conferência de Desarmamento na Europa, realizada em Estocolmo.
Em 1987, era primeiro-ministro Aníbal Cavaco Silva,
foi chamado a Lisboa para assumir o cargo de director-geral dos Negócios
Político-Económicos. Nessa altura, negociou a adesão de Portugal à União
da Europa Ocidental e chefiou a delegação que negociou com os Estados
Unidos os termos da utilização da Base das Lajes, nos Açores, em 1988 e
1989. Foi depois nomeado embaixador de Portugal em Pretória em 1989, passando
depois a exercer a função de conselheiro especial do Ministério dos Negócios
Estrangeiros para a Presidência Portuguesa da Comunidade Europeia. Nessa
qualidade, coordenou a Conferência de Paz para a Jugoslávia, de Janeiro
a Agosto de 1992, presidida por Lord Carrington.
Em 7 de Maio de 1990, foi feito comendador da Ordem
Nacional da Legião de Honra de França e a 15 de Novembro de 1990 foi
agraciado com a Grã-Cruz da Ordem da Fénix da Grécia.
Presidiu o Instituto Diplomático, desde Março
de 1994, quando assumiu a secretaria geral da União da Europa Ocidental
(UEO), em 16 de Novembro de 1994, após uma eleição em que contou com o
apoio explícito da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte e da Holanda. A escolha
recaiu sobre um diplomata de carreira atlantista numa altura em que a UEO
ganhou nova vida após a ratificação do Tratado de Maastricht, enquanto
pilar da defesa comum. Em 3 de Fevereiro de 1995, foi agraciado com a Grã-Cruz
da Ordem Militar de Nosso Senhor Jesus Cristo. Em Maio de 1997, foi
reconduzido na secretaria geral da UEO.
Além da diplomacia, era sobejamente conhecido pela sua
actividade como cronista na imprensa escrita. Foi o autor das crónicas
ficcionadas, escritas sob o alter-ego de Alfred Barnaby Kotter, um aristocrata
inglês elitista residente em Colares, Sintra, filho de uma mãe pró-fascista, e
as suas experiências e opiniões sobre o Portugal pós-25 de Abril
(supostamente traduzidas pelo seu «criado» português), que a princípio foram percepcionadas como crónicas reais. Aquelas crónicas
que surgiram no jornal “O Independente” (entre 1993 e 1998) foram, em
2004, recolhidas em livro em “Bilhetes de Colares” de A. B. Kotter (1982/1998),
publicado pelo jornal na sua colecção “Horas Extraordinárias - Série Inéditos da Impressa”, sendo a partir de então considerado por vezes um
brilhante romance (pelo texto longo, embora episódico, e o seu carácter ficcionado) e noutras um
brilhante livro de crónicas (mesmo se ficcionadas). Todas as crónicas, publicadas desde 1982
até
1998, foram editadas pela editora Assírio & Alvim, em 2007.
Sendo um relativo sucesso de popularidade, textos
deste livro surgem por vezes em blogues portugueses. “Bilhetes de Colares”
de A. B. Kotter recebeu em 2009 o Grande Prémio de Crónica da Associação
Portuguesa de Escritores.
Fora da ficção, era reconhecido enquanto escritor de
crónicas no jornal “Expresso” e em blogues.
O seu nome encontra-se na lista de colaboradores da
publicação académica “Quadrante” (1958/1962) publicada pela Associação
Académica da Faculdade de Direito de Lisboa.
Em 4 de Dezembro de 2008, recebeu o Grande Prémio
da Crónica 2008, da Associação Portuguesa de Escritores e da Câmara
Municipal de Sintra, distinguindo as obras em
português de autores portugueses publicadas em primeira edição no biénio
anterior à entrega do prémio, pela antologia “Bilhetes de Colares” de A.
B. Kotter (1982/1998).
José Cutileiro faleceu em 2020, em Bruxelas, na
Bélgica, onde se encontrava hospitalizado.
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