EFEMÉRIDE
– João Soares de Albergaria de Sousa, político liberal e abastado
proprietário rural da ilha de São Jorge, nasceu em Velas no dia 16 de Janeiro
de 1776. Morreu na mesma localidade em 1 de Fevereiro de 1875. Foi autor da
“Corografia Açórica”, obra publicada em 1822, hoje considerada o
documento fundador da açorianidade enquanto consciência política da
existência do povo açoriano.
Terá
adquirido a sua educação em
Velas. Em 1814, era alferes da milícia local. Em 1818,
embarcou para a Corte, então no Rio de Janeiro, ao que parece numa tentativa de
obter confirmação régia para os privilégios e títulos familiares.
Permaneceu
naquela Corte até aos princípios de 1820, regressando então a Lisboa. Chegou a
Portugal no auge da Revolução Liberal do Porto, encontrando as Cortes
Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa em plena
formação.
Envolveu-se
nos meios políticos de Lisboa, assumindo-se como membro da esquerda liberal,
fazendo-se membro da Sociedade Patriótica Filantropia e agregando em torno
de si um grupo de açorianos, entre os quais a maioria dos deputados que, do
arquipélago, tinham sido enviados às Cortes. Foi nesse ambiente que
assumiu a liderança do grupo que via o surgimento da Constituição Portuguesa
de 1822 como o momento próprio para introduzir nos Açores uma governação
democrática que pusesse fim à administração colonial existente e à prepotência
da governação na Capitania Geral dos Açores.
Foi
nesse período de grande efervescência política que redigiu a “Corographia
Açórica”. A obra é fruto da reflexão da tertúlia política reunida em torno
do autor, constituindo um claro manifesto de orientação política, escrito como
programa a seguir pelos deputados às Cortes Constituintes.
As
posições autonomistas e de unidade açoriana contidas na “Corografia Açórica”
acabaram por não vingar, já que a unidade açoriana se fragmentou nas disputas
pela independência dos governos da ilha de São Miguel e depois do Faial, face à
administração centralizada em
Angra. Apesar do fracasso da posição que defendia, Soares de
Albergaria permaneceu em Lisboa até 1827, adquirindo uma experiência política
que marcaria todo o seu percurso posterior.
Em
1827, regressou a São Jorge, assumindo a direcção dos negócios familiares e
adquirindo grande preponderância na vida política da ilha. Tal contudo seria de
pouca dura, já que no ano seguinte (1828) a situação política inverteu-se e os Liberais,
de que Soares de Albergaria era o líder incontestado, passaram a ser
perseguidos.
Em
16 de Maio de 1828, rebentou em Angra a contra-revolução e Miguel I de Portugal
foi aclamado rei absoluto. O capitão-general Manuel Vieira de Albuquerque Tovar
expediu de imediato ordens para que todas as ilhas jurassem fidelidade ao novo
monarca. Quando a embarcação que trazia as ordens aportou a Velas em 11 de
Junho de 1828, naquela que deveria ser uma breve escala a caminho das “ilhas de
baixo”, encontrou as autoridades locais hesitantes e com pouca motivação para a
aclamação, com o governador militar, José Maurício Rodrigues, certamente pressionado
por Soares de Albergaria, a protelar a convocação da necessária reunião
camarária.
Finalmente,
em 15 de Junho, a reunião foi feita de forma improvisada mas, quando se
preparava o juramento, Soares de Albergaria, à frente dos liberais locais,
interveio, argumentando que as ordens deveriam constar de Carta Régia e
não de um simples mandato do capitão-general. O estilo exaltado e eloquente, e
a influência que Soares de Albergaria certamente tinha, impediram o juramento.
A embarcação, face ao atraso registado, regressou a Angra, não se tendo
realizado as aclamações em
São Jorge nem nas demais ilhas para oeste.
Poucos
dias depois, em 22 de Junho, sublevou-se em Angra o Batalhão de Caçadores nº
5 e a Carta foi restaurada, proclamando-se a fidelidade da ilha a «D.
Maria da Glória e ao seu Augusto pai, o Senhor D. Pedro».
Apesar
da vitória liberal na Terceira, infelizmente para Soares de Albergaria e os
seus correligionários em São
Jorge , a revolução terceirense não conseguiu sequer dominar
toda a ilha Terceira, não se estendendo a São Miguel, onde entretanto se tinham
concentrado as forças miguelistas. Recebida, via São Miguel, a Carta
Régia de D. Miguel a exigir aos liberais de São Jorge a aclamação, mais não
restou que submeter-se e, em 28 de Outubro de 1828, D. Miguel foi jurado em Velas. Neste
juramento, participou Soares de Albergaria que, perante a força do governador,
que entretanto convocara as tropas para garantir o juramento, não pôde
resistir.
Dado
o seu poder e influência local, Soares de Albergaria escapou à prisão imediata,
mas publicado o Decreto de 4 de Março de 1829 e chegado à ilha o corregedor
Francisco José Pacheco, com alçada específica para punir aqueles que se tinham
oposto à aclamação, numa devassa que se iniciou em Novembro de 1829, foi um dos
primeiros indiciados.
Perante
a publicação da “Corografia Açórica”, pouco podia Soares de Albergaria
alegar em sua defesa e, em 14 de Novembro, foi detido e enviado para Ponta
Delgada, onde se tinha estabelecido um tribunal especial para punir os sediciosos
liberais. Julgado sumariamente, foi condenado a uma pena de cinco anos de
degredo em Angola, de nada lhe valendo a fortuna e influência familiar.
Interposto recurso, viu a pena ser comutada para cinco anos de prisão na
Praça-Forte de Elvas, para onde foi enviado em Junho de 1830.
Até
1834, esteve detido nas praças-fortes de Elvas e de Almeida, sofrendo grandes
agruras, ao mesmo tempo que os seus pertences, que haviam sido confiscados,
eram malbaratados nos Açores. A libertação só chegou em 1834, quando as tropas
do duque da Terceira capturaram aquelas praças.
Regressou
a São Jorge em 1835, encontrando os seus bens em grande desordem, já que as
propriedades lhe foram devolvidas mas num estado lastimoso. Veio também
encontrar muitos dos que o haviam perseguido bem instalados no poder municipal,
agora metamorfoseados em respeitáveis liberais.
A
partir daí, Soares de Albergaria iniciou um percurso que o manteve sempre na
esquerda liberal, militando com os Setembristas e no Partido
Histórico. Foi deputado na legislatura de 1837 e 1838, apoiando a Revolução
de Setembro e a nova Constituição.
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