segunda-feira, 22 de julho de 2019

22 DE JULHO - GIANFRANCESCO GUARNIERI


EFEMÉRIDE - Gianfrancesco Sigfrido Benedetto Guarnieri, actor, director de teatro e dramaturgo italiano naturalizado brasileiro, morreu em São Paulo no dia 22 de Julho de 2006. Nascera em Milão, em 6 de Agosto de 1934.
Foi um actor em destaque no Teatro de Arena de São Paulo e a sua mais importante obra foi “Eles Não Usam Black-Tie”. Em 2006, foi homenageado na 18ª edição do Prémio Shell de Teatro de São Paulo pela sua contribuição para o teatro brasileiro.
Era filho de músicos antifascistas, o maestro Edoardo Guarnieri e a harpista Elsa Martinenghi, que decidiram ir para o Brasil em 1936, estabelecendo-se no Rio de Janeiro. No início dos anos 1950, a família mudou-se para São Paulo. Líder estudantil desde a adolescência, Guarnieri começou a fazer teatro amador com Vianinha e um grupo de estudantes de São Paulo. Em 1955, criaram o Teatro Paulista do Estudante, com orientação de Ruggero Jacobbi. No ano seguinte, o TPE uniu-se ao Teatro de Arena
A sua peça de estreia, como dramaturgo, foi “Eles Não Usam Black-Tie”, encenada em 1958 pelo Teatro de Arena. O elenco contou com grandes talentos que começavam a despontar no teatro brasileiro, como o próprio Guarnieri, no papel de Tião. Programada para encerrar o trabalho do grupo, que vivia uma crise financeira, alcançou sucesso imenso, sendo um dos marcos da renovação do teatro brasileiro da época. A peça, o autor e o elenco foram premiados pelo então governador de São Paulo, Jânio Quadros, e o Arena foi salvo da crise. Paralelamente, o realizador Roberto Santos dava o pontapé inicial no Cinema Novo, com o filme “O Grande Momento”, um clássico do cinema brasileiro, protagonizado por Guarnieri e Miriam Pérsia.  
O director Sandro Polloni encomendou uma peça a Guarnieri, para ser representada pela companhia de Maria Della Costa. Guarnieri saiu do Arena por uns tempos para poder realizar esse trabalho com Maria Della Costa e, em 1959, surgiu “Gimba, Presidente dos Valentes”. Era o primeiro trabalho de Guarnieri num palco italiano e a direcção ficou a cargo de Flávio Rangel. Levada à cena de maneira pioneira, com a realidade dos morros cariocas, em forma de musical, inspirando-se em parte na sua própria experiência de vida. A encenação foi espectacular e a peça passou os meses seguintes em tournée pela Europa, sendo apresentada no Festival das Nações, em França.
A “Semente” estreou em 1961 no TBC e também contou com a direcção de Flávio Rangel. A peça, de cunho abertamente político e inteiramente fora dos padrões do TBC, abordava de forma contundente a militância comunista, criticando tanto os métodos da direita como os da esquerda. Embora contasse com actores consagrados, fosse uma montagem grandiosa e tivesse o aval da crítica, a peça teve problemas homéricos com a censura, o que acabou por esfriar o interesse dos frequentadores do então chamado “Templo Burguês do Teatro Paulista” e a peça saiu rapidamente de cena. Nesse mesmo ano, ainda no TBC, Guarnieri participou em duas montagens de Flávio Rangel: “Almas Mortas”, de Gogol, e a primeira montagem de “A Escada”, de Jorge Andrade.
Em 1962 voltou para o Arena, não só como actor e autor, mas como sócio proprietário. O Teatro de Arena acabou por se tronar uma sociedade entre Guarnieri, Augusto Boal, Paulo José, Juca de Oliveira e o cenógrafo Flávio Império. Juntos, participaram em várias peças nessa nova fase, como “A Mandrágora”, de Maquiavel (1962) e “O Melhor Juiz, o Rei”, de Lope de La Vega (1963).
O Filho do Cão”, de 1964, texto de Guarnieri, tratava da questão do misticismo religioso e da reforma agrária, já num turbulento contexto político (ano do Golpe Militar). A partir desse momento, a sua carreira, como a de todos os intelectuais ideologicamente colocados à esquerda, passou por momentos difíceis.
Optou então por utilizar uma linguagem metafórica e alegórica que tomaria corpo em montagens como os musicais “Arena conta Zumbi”, tendo como destaque a música “Upa Neguinho”, com parceria de Edu Lobo, e “Arena conta Tiradentes”, feitos em parceria com Augusto Boal.
Na década seguinte, daria prosseguimento àquele estilo em peças como “Castro Alves Pede Passagem” (1971) e, principalmente, “Um Grito Parado no Ar”de 1973 (que mostrava as dificuldades da classe artística naquele período) e “Ponto de Partida” de 1976 (onde utilizava uma vila da Idade Média como pano de fundo para focalizar a repressão a partir da morte do jornalista Vladimir Herzog), pontos capitais do teatro brasileiro nos anos 1970.
Na década de 1980, a sua carreira como autor de teatro tornar-se-ia cada vez mais esparsa, lançando poucos textos. Em 1988, escreveu “Pegando Fogo Lá Fora”; em 1995, publicou “A Canastra de Macário”, que é o momento em que a sua saúde lhe dá o primeiro susto, com um aneurisma na aorta. Em 1998, escreveu - com o filho Cláudio - a peça “Anjo na Contramão”; a sua última peça foi “A Luta Secreta de Maria da Encarnação”, realizada em 2001.
Apresentou-se num palco pela última vez em Agosto de 2005 (no mesmo Teatro Maria Della Costa onde, 46 anos antes, apresentara a peça “Gimba”). Fez ainda o papel de Marcelo Belluomo na gravação da peça “Você Tem Medo do Ridículo, Clark Gable?”, de Analy Alvarez, com direcção de Roberto Lage, para o programa “Senta que lá vem comédia” da TV Cultura. O programa foi transmitido em Setembro do mesmo ano.
Escreveu, em 1960, o libreto da ópera “Um Homem Só”, de Camargo Guarnieri. Foi parceiro musical de compositores como Carlos Lyra, Edu Lobo e Toquinho, entre outros.  
A partir do final dos anos 1950, passou a conciliar a sua bem-sucedida actividade no teatro com uma presença cada vez maior na televisão e no cinema. Tornou-se, assim, um dos melhores e mais populares actores brasileiros.
Na televisão, actuou em novelas como “A Muralha” (1968), “Mulheres de Areia” (1973/74)), “Jogo da Vida” (1981/82), “Cambalacho” (1986), “Rainha da Sucata” (1990), “A Próxima Vítima” (1995), “Sol de Verão” (1982/83), “Vereda Tropical” (1984/85), “Mandala” (1987/88), e “Que Rei Sou Eu?” (1989). Actuou igualmente em mini-séries como “Anos Rebeldes” (1992) e “Incidente em Antares” (1994).
O público mais jovem provavelmente reconhece-o pelo papel do carinhoso e divertido avô Orlando Silva, na série juvenil “Mundo da Lua” (1991/92).
No cinema, além de protagonizar “O Grande Momento”, também participou em filmes como “O Jogo da Vida” (1976), “Gaijin – Os Caminhos da Liberdade” (1980) e “Eles Não Usam Black-Tie”, versão cinematográfica da sua peça homónima (1981).  Este filme ganhou o Prémio Especial do Júri no Festival de Veneza. Protagonizou ainda “A Próxima Vítima” (1983), “Beijo 2348/72” (1990), e “O Quatrilho” (1995). O seu último filme foi “Contos de Lygia”, de 1998.
Foi secretário da Cultura da cidade de São Paulo, entre 1984 e 1986. Nessa oportunidade, procurou valorizar as acções comunitárias.
Guarnieri casou-se pela primeira vez em 1958 com a jornalista Cecília Thompson, com quem teve dois filhos, ambos também actores. Com a sua companheira dos últimos 40 anos, a socióloga Vanya Sant´Anna, teve mais três filhos, que também seguiram carreira teatral. 
Gianfrancesco Guarnieri estava a gravar, no Teatro Oficina, a telenovela “Belíssima”, da Rede Globo, em que interpretava o personagem Pepe, no dia 2 de Junho de 2006, quando se sentiu mal, sendo internado no Hospital Sírio-Libanês, onde veio a falecer, no mês seguinte, de insuficiência renal crónica. Foi sepultado no cemitério Jardim da Serra, na cidade de Mairiporã, onde morava.

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