Miguel Esteves Cardoso cresceu no
seio de uma família da classe média-alta lisboeta. O pai, de ascendência judaica
sefardita, foi oficial capitão-de-mar-e-guerra da Marinha, cavaleiro
da Ordem Militar de Avis (29 de Setembro de 1952) e comendador da
mesma Ordem a 4 de Outubro de 1961. A mãe era uma inglesa radicada em
Portugal, o que proporcionou a Miguel Esteves Cardoso tornar-se bilingue e lhe
deu uma espécie de visão distanciada de Portugal e dos portugueses.
Aluno brilhante, Miguel Esteves
Cardoso fez os seus estudos secundários na Saint Julian’s School e os
superiores fora de Portugal, no Reino Unido. Em 1979, na Universidade de
Manchester, licenciou-se em Estudos Políticos. Em 1983 doutorou-se
em Filosofia Política, com uma tese que relacionava a saudade e o
sebastianismo no Integralismo Lusitano. Posteriormente, voltou a
Inglaterra como visiting fellow do St. Antony’s College, em
Oxford, fazendo um pós-doutoramento em Filosofia Política, sob
orientação de Derek Parfit e de Joseph Raz.
Depois de terminar o doutoramento
no Reino Unido, Miguel Esteves Cardoso entrou em 1982 para o Instituto de
Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, como investigador
auxiliar.
Pouco depois ingressaria no Instituto
Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa da Universidade de Lisboa,
como professor auxiliar de Sociologia Política. Foi igualmente
co-fundador do Gabinete de Filosofia do Conhecimento.
Nas duas instituições foi
contemporâneo de outros sociólogos conhecidos pela sua participação na vida pública:
António Barreto, Vasco Pulido Valente e Maria Filomena Mónica.
No ano de 1988, porém, Miguel
Esteves Cardoso decidiu abandonar a carreira académica, para se dedicar à
comunicação social, nomeadamente ao jornal “O Independente”, cuja direcção
assumiu.
A partir do contacto estreito com
as bandas pós-punk e new wave da editora Factory, tais
como Joy Division, New Order, Durutti Column ou The Fall, aquando
da sua estada no Reino Unido, «MEC» (como era conhecido pelos fãs) começou por
se dar a conhecer como cronista, escrevendo sobre música pop nos jornais “Se7e”,
“O Jornal” (actual “Visão”) ou “Música & Som”. Essas
crónicas eram avidamente lidas pelos jovens portugueses, em complemento à
transmissão da mesma música em programas como “Rock em Stock”, de Luís
Filipe Barros, ou “Rotação”, “Rolls Rock” e “Som da Frente”,
de António Sérgio, na Rádio Renascença e na Rádio Comercial.
Também se dedicou à crítica literária e cinematográfica, no “Jornal de
Letras, Artes e Ideias”.
Da imprensa, rapidamente passou a
ser presença constante na rádio e na televisão, em parte devido à sua aparência
invulgar e desajeitada de jovem intelectual, ingénuo e perverso, e às suas
intervenções imprevisíveis, irónicas e irreverentes, às vezes desconcertantes.
Na rádio, foi autor e co-autor de diversos programas como “Trópico de Dança”,
“Aqui Rádio Silêncio”, “W”, “Dançatlântico”
e “A Escola do Paraíso”, todos na Rádio Comercial. Também
colaborou com Herman José, como guionista do programa “Humor de Perdição”,
transmitido pela RTP em 1987.
Estabeleceu polémicas com alguns
intelectuais e escritores como Fernando Namora ou Eduardo Prado Coelho.
A convite de Vicente Jorge Silva,
tornou-se colaborador do “Expresso”, onde as suas crónicas satíricas “A
Causa das Coisas” e “Os Meus Problemas”, conheceram o acompanhamento
regular de muitos leitores e o sucesso junto da juventude de classe média.
Já na década de 1990,
«MEC» viria a participar em vários talk-shows televisivos, entre os quais o
popular “A Noite da Má-Língua” (SIC) onde, semanalmente, sob a
moderação de Júlia Pinheiro e na companhia de Manuel Serrão, Rui Zink, Rita
Blanco, Alberto Pimenta, Luís Coimbra, Constança Cunha e Sá e Graça Lobo, eram
satirizadas figuras e situações da vida pública portuguesa e internacional.
No final dos anos 1990,
por motivos que nunca revelou, Miguel Esteves Cardoso abandonou subitamente os
ecrãs televisivos, tornando-se mediaticamente invisível durante bastantes anos.
Só voltaria a partir de 2017-2018, com o programa “Fugiram de casa dos seus
pais”, na RTP.
Ainda na década de 1980,
Esteves Cardoso fundou, com Pedro Ayres Magalhães, Ricardo Camacho e Francisco
Sande e Castro, a Fundação Atlântica, uma das primeiras editoras
independentes portuguesas, produzindo discos de nomes como Sétima Legião,
Xutos e Pontapés, Delfins, Paulo Pedro Gonçalves, Anamar e Amigos em Portugal dos Durutti
Column. Daria também contributo directo à música pop portuguesa como
letrista, com “Alhur”, de Né Ladeiras, e “Foram
Cardos Foram Prosas” (com música de Ricardo Camacho, interpretada por
Manuela Moura Guedes).
Monárquico e antieuropeísta convicto, apresentou-se como candidato
a deputado ao Parlamento Europeu, em 1987, como independente nas listas
do Partido Popular Monárquico, não conseguindo a eleição, mas dando a
esse partido o melhor resultado eleitoral de sempre.
Entre finais de 1987 e princípios
de 1988, Miguel Esteves Cardoso surgiu envolvido na criação de um projecto
jornalístico novo. Tem a seu lado Paulo Portas, Pedro Paixão e Manuel Falcão.
Nascia assim o jornal “O Independente”, que tinha como director Miguel
Esteves Cardoso, como director-adjunto Paulo Portas e como subdirector Manuel
Falcão.
A edição do jornal cabia à SOCI
- Sociedade de Comunicação Independente, S.A., criada em Fevereiro de 1988
e presidida por Nobre Guedes, e que tinha como accionistas a Cerexport (Nobre
Guedes), Joaquim Silveira (da promotora imobiliária SIL), Carlos
Barbosa, Miguel Anadia, Francisco e Pedro Fino e Frederico Mendes de Almeida.
“O Independente”
foi um projecto que influenciou sobremaneira o jornalismo português. Face à
imprensa esquerdista que prevalecia na época, assumia-se como um contraponto
conservador e elitista, mas simultaneamente libertário e culto. Teve como
colaboradores nomes como Agustina Bessa Luís, Vasco Pulido Valente, António
Barreto, João Bénard da Costa, Maria Filomena Mónica, Pedro Rolo Duarte, João
Miguel Fernandes Jorge, Joaquim Manuel Magalhães, M. S. Lourenço, Maria Afonso
Sancho, Leonardo Ferraz de Carvalho, Pedro Ayres Magalhães, Rui Vieira Nery ou
Edgar Pêra. Atribuiu uma enorme importância à fotografia, contando com o
trabalho de fotógrafos importantes como Inês Gonçalves, Daniel Blaufuks e
Augusto Alves da Silva. Enquanto Portas e Helena Sanches Osório faziam
estremecer os alicerces do governo de Aníbal Cavaco Silva, com a denúncia
semanal e impiedosa de escândalos políticos, «MEC» ocupava-se da parte
cultural, no destacável “Vida”; outras vezes, fazia dupla com Paulo
Portas em entrevistas a figuras da política e cultura portuguesa.
Em 1991, conforme combinado antes
da fundação do jornal, Miguel Esteves Cardoso deixa a direcção de “O
Independente” a Paulo Portas, para criar a revista mensal “K”,
financiada pela Valentim de Carvalho e pela SOCI, e - mais tarde
- por Carlos Barbosa. Apesar da qualidade gráfica e colaborativa, o projecto
acabou ao fim de dois anos, vítima da pouca orientação comercial.
Em 1995, com o final do cavaquismo
e a saída de Paulo Portas de “O Independente” que trocou a direcção do
jornal pela política activa no Centro Democrático Social, iniciou o seu
lento declínio, não obstante o regresso de Esteves Cardoso à direcção, em 2000.
Com efeito, sairia logo no ano seguinte que o semanário foi comprado e dirigido
por Inês Serra Lopes, até ao seu fecho, em 2006.
Em 1987, Esteves Cardoso foi
incentivado pela actriz Graça Lobo a integrar-se na Companhia de Teatro de
Lisboa, o que o levou à dramaturgia. Publicou então “Carne
Cor-de-Rosa Encarnada” (encenada por
Carlos Quevedo) no Teatro Villaret, “Os Homens” (encenado por
Graça Lobo) e traduziu várias peças de Samuel Beckett, das quais é digna de
menção “Worstward Ho”, que ficou com o título de “Pioravante
Marche”.
Anos mais tarde, intensificou a
sua relação com a literatura, o que o faz afastar-se do jornalismo. O seu
primeiro romance, “O Amor É Fodido”, publicado em 1994, foi um
best-seller, em boa parte devido ao título.
Publicou mais dois romances, “A
Vida Inteira” e “O Cemitério de Raparigas”,
e continuou a escrever crónicas em jornais, primeiro em “O Independente”,
mais tarde no “Diário de Notícias”. Em 1999, criou também um blogue,
chamado “Pastilhas”, que abandonou em 2002.
A partir de Janeiro de 2006,
retomou a sua colaboração no “Expresso”. Desde 2009, escreve uma crónica
diária no “Público”. Em 2013, passou a ser editado pela Porto Editora,
que reeditou toda a sua obra. Fez com Bruno Nogueira um programa semanal, de 13
episódios, na RTP 1, “Fugiram de Casa de Seus Pais”,
transmitido entre 9 de Dezembro de 2017 e 27 de Fevereiro de 2018.
Casou-se por três vezes, a última
das quais em 2000, com Maria João Lopes Pinheiro. Tem duas filhas, Sara e
Tristana, do primeiro casamento, a quem os Durutti
Column dedicaram um tema com esse título no álbum “Amigos em Portugal”.
Numa entrevista dada em 2006,
Esteves Cardoso reconheceu ter tido problemas com álcool e o uso de cocaína,
nos frenéticos tempos em que trabalhou no “Independente”.
É opositor do Acordo Ortográfico de 1990, gosta de gatos e aprecia a boa
gastronomia.
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